sexta-feira, 18 de julho de 2008

EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS


Cláudio Henrique de Souza Pires - UESB/Jequié



CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Dentre os estudos do léxico da língua portuguesa, o que mais se destaca, por sua perspicácia e polêmica por parte da mídia e os demais meios de comunicação é a questão dos empréstimos lingüísticos, mas especificamente os estrangeirismos oriundos da língua inglesa, americana ou anglo-saxônica.
Há muitos esforços políticos para banir os estrangeirismos da língua portuguesa no Brasil com o intuito de conservar a sua “pureza”, estes esforços são em sua maioria originados por pessoas ou instituições que não se aprofundaram nos estudos das ciências da linguagem. Os que defendem a extinção dos estrangeirismos no nosso idioma têm uma preocupação inútil e sem fundamentos teóricos, para embasar essa prática. Embora tenham uma boa intenção e serem sinceros patriotas, porém, estão sinceramente equivocados em relação ao que defendem sobre a nossa língua. Eles não têm o conhecimento diacrônico e muito menos sincrônico da língua portuguesa, somente possuem uma simples visão gramatiqueira do que é a linguagem. Imbuídos apenas em preconceitos lingüísticos, querem, assim como tentam criar um hegemonia lingüista dentro do próprio idioma, excluindo os diversos dialetos falados no Brasil, eles querem também criar uma exclusão de todas as palavras que são de origem estrangeira com base em argumentos falhos e sem coerência. Ignorando a nossa diversidade lingüística os que defendem a extinção do estrangeirismo adotam essa tese:

“nossa identidade nacional reside justamente no fato de termos um território imenso com uma só língua, esta plenamente compreensível por todos os brasileiros de qualquer rincão, independentemente do nível de instrução e das peculiaridades regionais da fala e da escrita”.

A posição política que eles defendem busca justificar o controle social pelo Estado da produção lingüística dos cidadãos. Poderia ser vista como legitima e defensável esta tese somente se fosse entendida como uma posição que busca defender a definição daquilo que conta como a língua do poder a condução das comunidades e da própria sociedade brasileira.
É interessante observar que esse fenômeno não ocorre somente no Brasil, mas em também em outros paises, como nos Estados Unidos, onde os conservadores gramaticais recorrem ao mesmo tipo de ideário, alegando haver ameaça ao inglês americano e com base nessa alegação, propõem ao congresso americano uma legislação de “proteção e defesa” do inglês, coibindo o uso de outras línguas, principalmente o espanhol.
Diante dessas lutas contra a “liberdade de expressão lingüística” podemos observar que sempre os que estão no controle do poder prevalecem e assim beneficiam a classe mais privilegiada da sociedade.
Nós estudantes de Letras, devemos estar conscientes de nosso papel diante dessa luta, devemos erguer a bandeira para defendermos diferenças lingüistas e assim construir um país mais justo e sem preconceitos.
A partir de agora, irei deixar os aspectos políticos-conteporâneos dos empréstimos lingüísticos e falarei um pouco sobre o processo de formação e de incorporação dos empréstimos numa língua, me deterei em apresentar mais especificamente os fenômenos que ocorreram em nossa língua portuguesa ao decorrer dos tempos.

OS EMPRESTIMOS LINGUISTICOS
Sabemos que toda língua adota e adapta vocábulos de outras línguas como parte íntegra de seu processo de desenvolvimento. A língua portuguesa atualmente adota principalmente vocábulos do inglês e do francês e os sujeita aos seus próprios preceitos lingüísticos. Os empréstimos se conformam à fonologia portuguesa e às suas regras de derivação. Os empréstimos também se adotam com restrições semânticas e às vezes com sensíveis mudanças de significado.

TIPOS DE EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS
O lingüista brasileiro Joaquim Mattoso Câmara Júnior, embasando-se no lingüista norte-americano Leonard Bloomfield, classifica os empréstimos lingüísticos em três tipos que são os empréstimos culturais, íntimos e dialetais:

• Aos empréstimos lingüísticos culturais pertencem todos os vocábulos adquiridos por meio de relações políticas, comerciais ou culturais entre povos de países diferentes.

• Os empréstimos lingüísticos íntimos são aqueles apreendidos quando duas línguas coexistem num mesmo território, por meio de reações íntimas no interior de uma determinada população.

• Os empréstimos lingüísticos dialetais são os resultados entre os falares de uma mesma língua, ou seja, da variabilidade lingüística regional, das variantes sociais e jargões especializados.

O LÉXICO – A INCORPORAÇÃO DOS EMPRÉSTIMOS
Uma língua não é estática, ao contrário, possui caráter dinâmico, evolui com o tempo. Desta maneira o léxico, aqui, entendido como o conjunto de vocábulos que formam uma língua, amplia-se, pois é através dele que esta se liga ao mundo externo e reflete os aspectos culturais da sociedade que a usa como meio de comunicação. É no léxico de uma língua que se acham incorporadas as experiências de uma comunidade de fala.
Toda língua pertence, fundamentalmente, a dois sistemas que englobam as classes de palavras, ou seja, o léxico ou pertence ao sistema aberto ou ao fechado. Ao primeiro, pertencem o substantivo, o adjetivo, o verbo e o advérbio nominal; ao segundo, o artigo, o numeral, o pronome, o advérbio pronominal, a preposição, a conjunção e a interjeição. Assim, novos vocábulos pertencentes ao sistema aberto podem ser incorporados ao léxico de uma língua. A esse processo denomina-se ampliação lexical que é o que chamamos popularmente de empréstimos lingüísticos, os quais não representam exatamente uma inovação vocabular, mas uma adoção de termos de outras línguas. “é a adequação da língua como saber lingüístico à sua própria superação e tem como determinante fins culturais estéticos e funcionais”.

DIVISÃO DOS EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS
Os empréstimos lingüísticos estão divididos em culturais e íntimos, onde dos primeiros fazem parte todos os vocábulos estrangeiros adquiridos em “virtude das relações políticas, comerciais ou culturais, propriamente dita com povos de outros países” . Nos empréstimos íntimos, duas línguas coexistem num dado território, não se processando “de fora para dentro, mas por meio de reações íntimas no próprio interior de uma população dada” . Como exemplo de empréstimo intimo, podemos citar o guarani e o espanhol, presentes no Paraguai; o português e o espanhol, na região fronteiriça entre Brasil e Bolívia, em Guajará-Mirim, no Estado de Rondônia.
Nesse tipo de empréstimo, uma língua predomina sobre a outra, “Há então uma língua forte, porque predominante na sociedade” . Dessa forma, poderão ocorrer três fenômenos: ou a língua dominada desaparece, restando um substrato na língua dominada, ou a língua dominante desaparece deixando um superstrato na língua dominada, ou permanecem as duas línguas, havendo troca de elementos, originando um adstrato. Também, nos empréstimos culturais, há, como nos íntimos, a predominância de uma das línguas: no português, existem termos estrangeiros por força de hegemonia cultural, como: langerie, abajur, chofer, madame (do francês), show, outdoor, e-mail, leasing, over (do inglês). Nas relações comerciais, os empréstimos são recíprocos:

“Não há, propriamente, uma língua predominante, que empresta sem tomar emprestado. Um povo ocidental ‘civilizado’, orgulhoso da superioridade da sua língua, pode nestas condições assimilar variados vocábulos de tribos ínfimas e selvagens. Comprova-o o inglês nas suas vicissitudes comerciais pelos sete mares do mundo”.

Vários são os fatores que podem gerar empréstimos íntimos:

• Imposição da língua dos conquistadores, havendo o predomínio imediato desta, aonde vários imigrantes chegam ao território conquistado, trazendo seus pertences, mulheres e filhos, situação em que os empréstimos vocabulares refletem as características e costumes na nação invasora. O português em relação ao tupi é um exemplo dessa transposição de cultura e sociedade e banimento dos elementos locais, os quais deixam apenas algumas marcas, como, nomes próprios e comuns geográficos, nomes de plantas e animais, mezinhas, comidas aprendidas com os nativos, em forma de substratos.

• Imposição lenta e gradual da língua dos conquistadores, havendo anexação do território conquistado em condições de província. É o caso da romanização do Ocidente durante a expansão do Império Romano, onde a língua dos vencedores foi imposta aos vencidos que permaneceram dentro do seu esquema social, assimilando a nova língua e cultura. Neste caso, também, da língua do povo vencido restam apenas substratos, emprestados à língua dos vencedores, numa situação de diglossia.

• Domínio de um grupo pequeno que desaparece, deixando marcas na língua do vencido como superstrato. Serve como exemplo para esse fenômeno o inglês que possui inúmeros termos vindos do francês por causa das conquistas normandas na Inglaterra.

• A imigração, propriamente dita que leva seus traços para a língua dominante no país em que se instalam para tentar fortuna, como é o caso de imigrantes os Estados Unidos da América, Brasil, entre outros. Estes têm a preocupação de assimilar, da melhor maneira possível, a língua do novo meio social e, a o mesmo tempo, podem infiltrar termos do seu léxico de origem, os quais, na maioria das vezes, são refutados. Ilustram esses fatos, no inglês, o vocábulo hambúrguer, de origem alemã, e, no Brasil, pizza originário do italiano.

São exemplos de empréstimos lingüísticos no Brasil:

• Indianismos: são resultantes da adaptação dos colonizadores. Servem de ilustração para esse tipo de empréstimo os vocábulos jerimum, macaxeira, muriçoca, carapanã, abacaxi, capixaba, açaí, cupuaçu, entre outros.

• Africanismos: resultantes do convívio com os escravos domésticos, principalmente com aqueles do sexo feminino (mucamas, cozinheiras). São exemplos desses empréstimos: macumba, mocotó, caxumba, jiló, banana, zebra, girafa etc.

• Outros estrangeirismos vindos com levas de imigrantes: piano, chau, pizza (do italiano), guerra (do alemão), chocolate, xícara, cacau (do espanhol) muitos outros.

EMPRÉSTIMO LINGUÍSTICO DIALETAL

Segundo Bloomfield, ainda, existe o empréstimo lingüístico dialetal que se realiza entre falares da mesma língua, ou seja, resultante variabilidade lingüística regional, das variantes sociais e jargões especializados. É feito interior da comunidade lingüística, envolvendo formas variantes da mesma língua. Pequenas comunidades lingüísticas são envolvidas por duas forças contrárias a que Saussure chamou espírito de campanário – a qual opera “no sentido de assegurar a estabilidade da língua diante de influências que o penetram de todo lado, provenientes de falares congêneres” e espírito de intercurso – que possui a tendência de quebrar separação existente na língua, através de constantes empréstimos feitos a outros falares.

O empréstimo dialetal afeta de forma diferente o sistema lingüístico, podendo modificar sua estrutura básica. A influência da variante popular sobre a norma culta é uma ocorrência observável na língua portuguesa: o caso de a gente como pronome. Também a variante regional de maior prestígio influencia com seus termos as demais. No Brasil isto ocorre com variante do Centro Sul (Rio – São Paulo) em relação às outras regiões. É o empréstimo de prestígio – fonológico, sintático ou lexical.

Como empréstimo dialetal, inclui-se língua especial, caracterizada por termos técnicos de cada área profissional que se tornam empréstimos lingüísticos quando são aproveitados com o valor rigorosamente técnicos, uso corrente, ou quando termos do uso passam a ser utilizados com sentido uma determinada profissão, decorrente “da delimitação significativa que o termo adquire determinados contextos da língua especial última análise de natureza sintagmática”. Fazem parte, ainda, do empréstimo gírias, propriamente ditas, e a língua literária. As gírias se desenvolvem em contraste com a língua comum, através das classes populares. Isso se dá mais especificamente nos grandes centros urbanos, caracterizando, também “uma atitude estilística (...) de desrespeito intencional à norma estabelecida”. A língua literária, posta em confronto com a língua comum, também apresenta empréstimos, tornando-se, assim, uma língua secundária. Isso se justifica pelo fato de as escolas literárias ou autores possuírem estilos próprios, como, por exemplo, a obra de João Guimarães Rosa, que não corresponde à realidade da língua comum do Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, não existe língua pura, nem estática. Uma das características principais da língua é que ela evolui com o tempo, por isso é dinâmica. Esse dinamismo se vê com mais clareza no léxico, pois este se expande com bastante freqüência para incorporar as experiências pessoais e sociais das comunidades de fala. Com essa expansão lexical, ocorre o fenômeno denominado empréstimo lingüístico, que é a adoção de termos de outra língua ou de termos pertencentes à mesma língua, envolvendo vocábulos das diversas regiões onde esta é utilizada.
Embora o empréstimo não represente uma inovação lingüística, é um mecanismo de grande importância na ampliação do léxico de uma língua, uma vez que os falantes de línguas vivas mantêm um contato interpessoal por causa de sua convivência, promovendo intercâmbio cultural, social e político, utilizando-se, para isso, de um sistema lexical, que é a soma de experiências da sociedade e da sua cultura.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS



CÂMARA JR., Joaquim Mattoso. Princípios de Lingüística Geral. 4. ed. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1974.


CARVALHO, Nelly. Empréstimos Lingüísticos. São Paulo: Ática, 1989 (Série Princípios).


FIORIN, José Luiz (org.). Introdução à Lingüística I: Objetos Teóricos. São Paulo: Contexto, 2002.


FARACO, Carlos Alberto (org.). Estrangeirismos: guerras em torno da língua. São Paulo: Parábola, 3ª ed. 2004. pág. 26.

4 comentários:

Anônimo disse...

O que é neologismo???
Gostaria que aprimorasse seu blog para pesq. escolar de português!

viviane disse...

Gostaria de com poucas palavras já esclarecer a dúvida anterior. Neologismo em sítese são palavras criadas que não te, ainda, um uso corrente, ou seja não é falada por todos os falantes demodo geral, por isso não são encontradas nos dicionários. São formadas da necessidade momentanea do usuário.
espero ter ajudado!
abraços

Anônimo disse...

Gostei muito do seu post, está de parabens!

Régia & cia disse...

Só uma dúvida, é necessariamente obrigatório que uma palavra para ser considerada empréstimo tem que estar presente nos dicionários?